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sexta-feira, 30 de agosto de 2013

OS MÚLTIPLOS OLHARES DO EDUCADOR

Os múltiplos olhares do educador                                         
“Aprendi que um homem só tem o direito de olhar outro de cima para baixo para ajudá-lo a levantar-se”. Este apotegma atribuído ao escritor colombiano Gabriel Garcia Marques traduz adequadamente o propósito de nosso tema: Os vários olhares do educador Cristão.

OLHAR ALÉM DOS ESTEREÓTIPOS

O valor e a importância do olhar estão impressos na ciência, na arte, na indústria de entretenimento entre outros. Nossa sociedade tornou-se menos auditiva e mais midiática e visual. Somos atraídos pelas cores, pelo colorido das propagandas, das roupas, das imagens. Porém, não aprendemos a ver, a olhar com profundidade. Escapa de nossas vistas o discernimento do olhar.

Olhamos, mas não vemos. Vemos, entretanto, não discernimos. Olhamos, mas procuramos os estereótipos sociais; fitamos os olhos à procura do traço retilíneo e nos espantamos ao encontrar o curvilíneo. Mas a vida e seus atores não seguem as arestas retilíneas da rotinização do cotidiano, mas as curvas e desvios do viver. Não segue a marcha militar, mas o borboletear da infância, da vida. Somos, portanto, desafiados como professores a olhar além do “lugar comum”, dos “clichês”, dos “chavões”. A ver além das máscaras da subjetividade de nossos alunos.

OLHAR ALÉM DAS MÁSCARAS TEATRAIS

Na Grécia clássica, os atores do teatro grego usavam uma máscara a cada apresentação. Além de esconder o rosto, o artefato representava o personagem que seria tipificado. As máscaras eram estáticas, de feições imóveis, pois indicavam o destino final do personagem. Essas máscaras eram chamadas de persona, e deste termo originou-se a palavra personalidade, para indicar o “elemento estável da conduta da pessoa”.

Quando os atores colocavam a persona, deixavam de ser quem eram para assumir o seu papel entre os saltimbancos. É para além dessa compleição social que o educador é desafiado a olhar. Ele é instado a ver um pouco além da máscara e do personagem que o aluno representa no grande palco teatral, chamado sala de aula. Alguns alunos usam a máscara da tragédia, do narciso, do mito, do herói, do cômico. Infelizmente, os professores conhecem apenas os papéis do alunato na escola, e deixam escapar aos olhos à verdadeira persona que eles assumem na vida. Todavia, qual o conceito de olhar que subjaz o presente tema?

OLHAR COM PROFUNDIDADE

Na presente abordagem, pouco adianta o sentido etimológico adoculare, muito menos a sintaxe ou morfologia do termo. A linguagem e seus jogos semânticos são capazes de atribuir às palavras sentidos diferentes daqueles que se concebem por meio de suas raízes; nisto, talvez, concordasse Wittgenstein.

Olhar, nesta acepção, não diz respeito ao olhar enquanto função ocular. Olhar é ver em profundidade. É apreender crítica e analiticamente uma situação em sua dimensão totalizante. É ver além do invólucro subjetivo das aparências fugidias. É diferençar e mediar através da observação dos fatos, dos objetos, dos sujeitos, da subjetividade.

Trata-se de uma visão que ultrapassa a exterioridade e a perspectiva plástico-pictural, para usar uma expressão de Bahktin. A propósito, Bakhtin afirmara que a visão exterior ou plástico-pictural, “refere-se à percepção das fronteiras exteriores que configuram o homem”. [É uma visão associada ao aspecto físico, transitório, circunstancial, metamórfico. Porém essa forma de “ver a outrem” se reduz na subjetividade do professor que, desatento, julga pela aparência fugaz, em constante mutação. Bakhtin assevera que

Apenas o outro pode, de maneira convincente, no plano estético (e ético), fazer-me viver o finito humano, sua materialidade empírica delimitada. Num mundo que me é exterior, o outro se oferece por inteiro à minha visão, enquanto elemento constitutivo deste mundo. A cada instante, vivo distintamente todas as fronteiras do outro, posso captá-lo por inteiro com a visão e o tato; vejo o traçado que lhe delimita a cabeça, o corpo contra o fundo do mundo exterior; no mundo exterior, o outro se mostra por inteiro à minha frente e minha visão pode esgotá-lo enquanto objeto entre os outros objetos, sem que nada venha ultrapassar o limite de sua configuração, venha romper sua unidade plástico-pictural, visível e tangível.[2]

Contudo, essa visão exteriorizada é reducionista, cega e incapaz de ir além do invólucro material que tanto “aproxima” como afasta o indivíduo do outro. Com este olhar, o professor apenas toca o aluno enquanto sujeito tátil, “objeto entre os outros objetos”, mas jamais lhe atinge a alma, o ser integral – emoção, vontade e intelecto. O docente que assim vê não é capaz de enxergar, uma vez que não fora educado a olhar além do invólucro da subjetividade.

Atenta ao olhar desagregador e reducionista do professor, Madalena Freira Welfort afirmara que “não fomos educados para olhar pensando o mundo, a realidade, nós mesmos. Nosso olhar cristalizado nos estereótipos produziu em nós paralisia, fatalismo, cegueira”.[3]

De acordo com a educadora é imprescindível que o professor eduque o seu próprio olhar; que deixe de ser míope e condicionado. Isto somente é possível se o próprio abandonar o “olhar cristalizado”, condicionado por uma cultura que desaprendeu a olhar com alteridade, compaixão e amor, no entanto, aprendeu a ver o próximo como seu concorrente, rival. Esses estereótipos são formados culturalmente nas salas dos professores, nas reuniões docentes, nos corredores escolares, quando emitimos acriticamente nossas opiniões reducionistas a respeito de nossos alunos, rotulando-os com os estereótipos de uma sociedade excludente e competitiva.

OLHAR “UM-COM-O-OUTRO”

O olhar espacial do mestre, que configura o outro como mero recorte da realidade que o cerca, produz uma visão distorcida. Às vezes, encerra o sujeito no determinismo histórico e no fatalismo teleológico; como afirmara Bakhtin, nas “fronteiras exteriores que configuram o homem”.[4]Todavia é preciso romper com a teia dos condicionamentos culturais; pôr-se em movimento oposto à paralisia que se recusa à alteridade; abrir-se ao colóquio dialético-dialógico.

O pensamento arguto de Heidegger a respeito do “ser-um-com-o-outro” (Miteinandersein) complementa a presente asserção. Para o filósofo, o professor pode estar junto aos seus alunos no auditório[5] ou na sala de aula e mesmo assim não estar “um-com-o-outro”. O espaço escolar torna-se, portanto, uma teia de vivências em que cada ator, embora presente, se aparta do outro por motivos vários. Heidegger chama isto de “um não-ser-uns-com-os-outros privativo”. [6]O sujeito fechado em seu próprio casulo, divide com outro um recorte do espaço, mas privativa seu ambiente.

Estar um-com-o-outro não é apenas habitar em, mas conviver com. Apesar de o professor e o aluno ocuparem funções distintas na sala de aula, têm por intuito o mesmo: o ensino-aprendizagem, e, segundo Heidegger, “o intuito voltado para o mesmo pertence à essência do ser-aí” [7] (Dasein). O ser-aí é o ente que se explícita historicamente a partir das relações que experimenta com o mundo. É através dessa relação-abertura com o mundo que o sujeito encontra a si mesmo. Ser-aí, como traduz Casanova, é “ser-em-uma-amplitude-aberta; ser-clareira”. [8]

OLHAR O SUJEITO COGNOSCENTE

Por conseguinte, o professor não pode fechar-se à experiência que emana das responsabilidades de sua existência e profissão, mas, parafraseando Bakhtin, “vivenciar-se através de sua singularidade que se distingue fundamentalmente das formas do outro através das quais vivencia a todos os outros sem exceção”. [9]

Ser professor é assumir um compromisso com a transformação do outro, da sociedade, da igreja, do mundo. O professor é uma parte do todo que forma o professorado, entretanto, a individualidade não pode ser reduzida à totalidade. O professor, para usar uma expressão de Hannah Arendt, deve fugir da condição de bucha de consenso e gado cognitivo. [10]

O educador precisa assumir suas responsabilidades, não apenas educacionais, mas sociais; ser crítico; ver-se singular no mundo, sem contudo, particularizar-se a ponto de ignorar as injustiças, e de se afastar do outro. Ele não deve prescindir da afetividade, mas estabelecer uma relação amistosa e pessoal com o alunato, tendo aos seus olhos sua história e subjetividade, assim como a história e a subjetividade de seus alunos.

O encontro dessas duas histórias e subjetividades distintas, mesmo que se conflitem, é de responsabilidade do educador colocar-se como protagonista principal desse processo, participando efetiva e afetivamente da construção de si e do outro. Segundo Paulo Freire

o clima de respeito que nasce de relações justas, sérias, humildes, generosas, em que a autoridade docente e as liberdades dos alunos se assumem eticamente, autentica o caráter formador do espaço pedagógico. [11]

O homem sente-se pessoa não apenas pelo que é, mas também quando vê o seu reflexo no outro que lhe é semelhante. Alteridade, humildade, política, justiça e práxis devem nortear a formação do educador cristão. Logo, não é admissível ao múnus docente a tirania, a síndrome da normalidade e o desinteresse do professor pelo ser humano.

Portanto, o olhar ultrapassa as raias da mera visão e abarca o sujeito cognoscente – o ser cônscio de suas capacidades e limites. Olhar faz parte da imaginação, da fantasia, da reflexão pretérita do que fomos, da consciência presente do que somos, e da utopia futura do que devemos ser. No mundo unificado do conhecimento, assegura Bakhtin, “não posso colocar-me enquanto eu-para-mim em oposição a todos os homens do passado, do presente e do futuro concebidos como outros para mim”.[12]Isto exige uma reeducação do olhar que não se restringe à estética, mas amplia-se com a ética. Uma “aprendizagem de desaprender” à moda de Fernando Pessoa:

O essencial é saber ver,
Saber vem sem estar a pensar,
Saber ver quando se vê
E nem pensar quando se vê
Nem ver quando se pensa.
Mas isso (tristes de nós que trazemos alma vestida!)
Isso exige um estudo profundo,
Uma aprendizagem de desaprender
(Obra poética, p.217).

OLHAR FORMANDO COMPETÊNCIAS

A aprendizagem do desaprender é o que pretendemos em relação ao olhar do professor. Para que isto aconteça é necessário que o educador abandone as amarras lazarentas de seus condicionamentos histórico-sociais; que deixe para trás, depositado no túmulo, seu olhar reducionista e condicionante. Talvez, somente assim sejamos capazes de mudar o nosso olhar concernente ao múnus docente, a fim de que, como afirma Perrenoud, desenvolvamos a competência de “conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação”. [13]

O desenvolvimento desta competência é o resultado da capacidade didático-pedagógica do professor ao proporcionar aos educandos diversas situações que lhes favoreçam a aprendizagem. Todavia a distância entre o real e o ideal mais uma vez faz-se presente, como uma constatação insofismável. E o olhar diferenciado do professor é deveras importante. Perrenoud alerta que uma “situação de aprendizagem ótima”, “aos olhos de muitos professores em exercício ainda parece uma utopia” (p.55). Isto porque, segundo o autor, seria preciso encarregar-se de cada aluno pessoalmente, o que não é possível e nem desejável (p.56). O meio-termo para essa problemática segundo o educador francês é organizar diferentemente o trabalho em aula, acabar com a estruturação em níveis anuais, ampliar e criar novos espaços-tempos de formação, jogar, em uma escala maior, com os reagrupamentos, as tarefas, os dispositivos didáticos, as interações, as regulações, o ensino mútuo e as tecnologias da formação. [14]

Essa competência global não se restringe apenas a um dispositivo, ou a métodos e instrumentos específicos, pelo contrário. É necessário o emprego de todos os recursos disponíveis a fim de “organizar as interações e atividades de modo que cada aprendiz vivencie, tão frequentemente quanto possível, situações fecundas de aprendizagem” (p.57). Para o adequado desenvolvimento desta competência sistêmica são necessárias quatro competências específicas:

·         Administrar a heterogeneidade no âmbito de uma turma;
·         Abrir, ampliar a gestão de classe para um espaço mais vasto;
·         Fornecer apoio integrado, trabalhar com alunos portadores de dificuldades;
·         Desenvolver a cooperação entre os alunos e certas formas simples de ensino mútuo. 15]

Para o atendimento dessas competências, urge um novo olhar do educador a respeito de sua formação, sua práxis, seus alunos, de sua gestão em sala de aula, e de seus relacionamentos com seus pares.

De acordo com Libâneo, para a identidade profissional dos professores e o desenvolvimento de competências são necessários certos requisitos profissionais que tornam alguém um professor ou uma professora. Esse conjunto é denominado profissionalidade. [16]Contudo a profissionalidade, segundo Libâneo, supõe a profissionalização. Esta última refere-se às “condições ideais que venham a garantir o exercício profissional de qualidade” (p.75), tais como: “formação inicial e formação continuada nas quais o professor aprende e desenvolve as competências, habilidades e atitudes profissionais; remuneração compatível com a profissão [...]” (p.75).
De acordo com as duas últimas visões apresentadas, Perrenoud e Libâneo, a ação docente traduz-se em conflitos entre a teoria e a prática, o ideal e o real. Nossa desejo, portanto, é que o professor, através da educação do olhar, saiba mediar essas realidades, para que cumpra efetivamente o seu papel enquanto educador cristão.

Esdras Costa Bentho é teólogo, pedagogo, pesquisador na área de formação de professores, e educação infantil.
www.teologiaegraca.blogspot.com

[1]BAKHTIN, Mikhail. A estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1997, p.57.
[2]Id.Ibid., p.57.
[3]WEFFORT, Madalena Freire (et. al.) Educando o olhar da observação. In: WEFFORT, Madalena Freire (et. al.) Observação, registro, reflexão. São Paulo: Espaço Pedagógico, 1997, p. 10-36.
[4]BAKHTIN, Mikhail, id.ibid.,p.57.
[5]No contexto original desta citação, Heidegger está filosofando com seus alunos em certo auditório a respeito da Verdade e ser: Da essência originária da verdade como desvelamento. Daí a presente aplicação usada pessoalmente pelo filósofo. Ver HEIDEGGER, Martin. Introdução à filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2008, p.96.
[6]HEIDEGGER, Martin. Introdução à filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2008, p.96.
[7]Id.ibid.,p.96.
[8]Id.Ibid.,p.XVII
[9]BAKHTIN, Mikhail. A estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1997, p.58.
[10]ARENDT, Hannah. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1988, p. 16,22.
[11]FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Editora Paz e Terra, 2001, p.103.
[12]Id.Ibid.,pp.57-8.
[13]PERRENOUD, Philippe. 10 Novas competências para ensinar. Porto Alegre: Editora Artmed, 2000, p.55-65.
[14]Id.Ibid., p.56.
[15]Id.Ibid., p.57.
[16]LIBÂNEO, J.Carlos. Organização e gestão da escola: teoria e prática. 5.ed., rev. amp. Goiânia: MF Livros, 2008, p. 75.
* Escritor, professor da FAECAD no Rio de Janeiro, trabalhando na Sociedade Bíblica Ibero-Americana, ex-redator do Setor de Educação Cristã e ex-chefe do Setor de Bíblias e Obras Especiais da CPAD.

 Escrito por Prof. Esdras Costa Bentho*

terça-feira, 27 de agosto de 2013

PROFESSORES DESNECESSÁRIOS À IGREJA: O VOCACIONADO ILUDIDO






O conceito que torna o professor leigo, aquele que carece de formação profissional, uma pessoa autorizada para ensinar pelo “dom” que possui; e o que dispensa a formação bíblica e a vocação ministerial em troca da experiência e capacitação profissional são reducionistas e um perigo para a educação cristã dominical


Porém, o ideal é que o professor carismático exerça a docência cristã sem excluir a formação técnica, e que o educador profissional desempenhe o munus docendi no magistério eclesiástico sem dispensar a capacitação teológica e pneumatológica.


A vocação e a capacitação técnica são necessárias e indispensáveis para o completo desempenho da docência cristã dominical.


Outro grave problema em torno da hipervalorização da “vocação” ou do “dom” para o ensino em detrimento à formação técnica é a completa ausência de comprometimento da liderança:


(1) na formação e capacitação de professores;


(2) em preparar as condições materiais para o exercício do magistério cristão; e

(3) no acompanhamento sobre o que se ensina, como se ensina e por que se ensina. Certa vez, percebi que havia muitas conversões em nossa igreja local, entretanto, esses novos convertidos não recebiam qualquer instrução a respeito de sua nova vida em Cristo.


Solicitei, então, ao pastor para que fizéssemos uma classe de discipulado, antes mesmo de a CPAD organizar as lições para o discipulado (projeto que tive a honra de participar escrevendo duas lições: “O céu verdadeiramente existe?”, e, “O inferno verdadeiramente existe?”).


Contudo, o estimado líder disse-me: – Irmão Esdras, não há espaço na igreja para organizar mais uma classe, mas como o irmão é “vocacionado”, dará um jeito. E de fato, a solução surgiu, mas com algumas contestações. Havia nas dependências da igreja uma sala com instrumentos velhos e aparelhos eletrônicos defeituosos. Solicitei o espaço, mas o pedido foi rejeitado.

Depois de muito insistir, o espaço foi liberado, mas com uma condição: às 7hr30m eu e minha esposa deveríamos tirar os objetos do lugar, transformar o espaço numa sala de aula e, depois de concluído a aula, recolocar as tralhas no lugar.


Isto fizemos durante seis meses ininterruptos, até que fui chamado para trabalhar na sede. Eu era diácono na ocasião. Bom, essa história não é diferente daquelas que ouço toda vez que viajo pelas igrejas do Brasil dando cursos e palestras para professores da ED.

Talvez você tenha se identificado com ela. Mas o que de fato aprendemos com essa experiência? Aprendemos que, com a argumentação de que os vocacionados já estão preparados por Deus para a tarefa, certos líderes jogam toda responsabilidade e fardo “nas costas” do professor, crendo que o fato de serem “chamados” é suficiente para o completo desempenho do ministério de ensino. Todavia, é responsabilidade da liderança, seja da igreja, seja do superintendente da ED, dispor aos professores os aparatos e recursos necessários para o pleno desenvolvimento de suas tarefas educacionais.


Como o educador pode se preocupar em atender adequadamente o alunato se está preocupado com o local, com o giz, com o quadro, enfim, com os recursos didáticos? Muitos professores paladinos, no entanto, tiram de seu próprio provento para prover as urgências e demandas da Escola Dominical.


Outrossim, perpassa também pelo conceito de “professor vocacionado” a ideia de que ele não necessita de uma formação técnica, pois o “dom espiritual” é suficiente para o exercício docente. Mais uma vez o problema hermenêutico serve de esteio para fundamentar essa distorção.


Citam-se os textos de Sl 81.10: “abre bem a tua boca, e ta encherei”; Jo 14.26: “Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito”; ou ainda 1Jo 3.27, entre outras passagens. Todavia, se esquecem de que o dom de ensino é encarnacional.


O pastor e professor de Teologia da Assembleia de Deus em Cingapura, David Lim, afirma que entre as várias teorias concernentes à natureza dos carismas, três se destacam:

(1) a que afirma que os dons são capacidades naturais; a que

(2) os descrevem como totalmente sobrenaturais, e a

(3) bíblica, chamada encarnacional [1].

Uma entende que os dons espirituais são capacidades ou talentos naturais santificados.

Outra erradica qualquer responsabilidade humana nos exercícios dos carismas. A última, entretanto, pressupõe uma ação cooperativa tanto do Espírito quanto do homem.


De Acordo Com David Lim


Os dons são encarnacionais. Isto é, Deus opera através dos seres humanos. Os crentes submetem a Deus sua mente, coração, alma e forças. Consciente e deliberadamente, entregam tudo a Ele. O Espírito, então, os capacita de modo sobrenatural a ministrar acima de suas próprias capacidades humanas e, ao mesmo tempo, expressar cada dom através de sua experiência de vida, caráter, personalidade e vocabulário. [2] 


De modo geral, Lim quer dizer que todo dom pode e deve ser exercido na igreja, levando-se em consideração as idiossincrasias individuais dos crentes e, pelo fato de ser encarnacional, com amor, todo e qualquer dom deve ser avaliado pela comunidade cristã.

Admitindo-se o posicionamento teológico de que os dons são encarnacionais, podemos compreender o que Paulo afirmou em Romanos 12.7 a respeito do carisma do ensino: εἲ
τεδιδάσκωνν τή διδασκαλία (lit. o que ensina, no ensino).

A maioria dos tradutores entende que se trata de uma forma intensificada e subentendida de se referir à diligência no exercício do carisma de ensino, acrescentando os termos “dedicação” (ARC, TB); e “esmero” (ARA). Traduções mais literais preferem manter “ensino, ensinando” (BJ); “ensinar, que ensine” (ECP); “ensinamento, para ensinar” (BP); “ensinar, ensine” (NVI).[3]

Russel Champlin, ao interpretar essa perícope, afirma

Aquele cujo ofício consiste em ensinar, deveria esforçar-se por aprimorar os seus conhecimentos, por melhorar a eficácia dos seus métodos de ensino, aumentando o seu interesse pessoal por aqueles que são os seus alunos. Um dos mais graves escândalos das modernas igrejas evangélicas é que a grande maioria dos seus mestres em nada melhora com a passagem dos anos, incluindo nisso tanto o conhecimento como os métodos empregados [...]. [4]


Conforme Lim e Champlin, o dom de ensino não é apenas uma capacidade sobrenatural que o Espírito Santo concede ao cristão para o desempenho do magistério eclesiástico, mas também um carisma que deve ser exercido por meio do aprendizado pedagógico constante, da aquisição de técnicas didáticas, e de seu emprego eficiente por parte do professor. É um dom espiritual, no entanto, seu pleno exercício depende da cooperação, esforço e diligência do crente.


O cristão coopera com o Espírito Santo para que o dom, espiritual e potencializado pelo Espírito, desenvolva-se eficientemente e sem nenhum embaraço ou impedimento. O professor é o canal inteligente e discernente pelo qual o Espírito de Cristo ministra aos crentes o conhecimento dos mistérios do Evangelho.


Pelo fato de o dom de ensino ser encarnacional, a igreja deve insistir e investir no desenvolvimento pessoal e profissional de seus professores, a maioria carente de formação adequada. Chama-se a esse processo de educação ou formação continuada.

Leia estes outros artigos também:

·            Novos Professores para uma Nova Igreja
·            Dicionário Bíblico
·            Atlas Bíblico em Powerpoint
Postado por Márcio Melânia  http://www.blogger.com/img/icon18_email.gif


domingo, 25 de agosto de 2013

TEMA: TOMÉ O DESVIADO







Texto base: (João 20:19-25)                                               Data: 22/08/13        


I.              Introdução:

Um crente sem igreja é como uma criança sem família, um soldado sem exército, um jogador sem equipe, uma brasa sem braseiro, um estudante sem escola, um marinheiro sem navio, uma ovelha sem rebanho. Nós não temos de pertencer a uma igreja para sermos salvos, mas se formos salvos passamos a pertencer à Igreja.

II. O QUE O DESVIADO PERDE

1.    Perdeu a comunhão do Senhor Jesus, que prometeu: “Habitarei no meio deles, e com eles caminharei. Serei o seu Deus, e eles serão o meu povo” (2 Cor. 6:16).

2.    Perdeu a bênção do Mestre: "Paz seja convosco" (Jo 20:21).

3.    Perdeu a alegria que aconteceu -- "os discípulos se alegraram, vendo o Senhor" (Jo 20:20).

4.    Perdeu uma comissão para servir: "Assim como o Pai me enviou, também Eu vos envio a vós" (Jo 20:21).

5.    Perdeu o enchimento de poder: "E, havendo dito isso, assoprou sobre eles e disse-lhes: Recebei o Espírito Santo” (Jo 20:22).

6.    Perdeu a certeza de que Cristo ressuscitara dos mortos! Ele perdeu a fé. Ficou conhecido como “Tomé o incrédulo” (Jo 20:27).


É maravilhoso ver como aquele ajuntamento transformou crentes mortiços em testemunhas vivas e ousadas.

III. O QUE ACONTECE COM UM DESVIADO

Em Lucas 24.13 vemos dois discípulos que iam a caminho de Emaús, 11km distante de Jerusalém. Estes deixaram a comunhão dos irmãos.

1. Os seus olhos estavam como que fechados (v.16).
“O deus deste século cegou o entendimento dos incrédulos para que não lhes resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo” (2 Co 4:4)

2. Estavam tristes (v.17).

3. E quando o Senhor se revelou a eles, imediatamente voltaram a Jerusalém (à comunhão dos seus irmãos) (v. 33).

IV. TIPOS E EXEMPLOS DE DESVIADOS

1.    Desviado da Fé – Tomé (Jô 20:25)
2.    Desviado da verdade – Himeneu e Fileto (2 Tm 2:17,18)
3.    Desviado da palavra – Escribas e Fariseus (Mt. 23:33)
4.    Desviado da Igreja – Cleopas (Lc 24:18)
5.    Desviado do Ministério – Judas Iscariotes (At 1:25)

V. APOSTASIA É PECADO!

O Espírito diz claramente que nos últimos tempos alguns abandonarão a fé e seguirão espíritos enganadores e doutrinas de demônios. (1 Tm 4:1-3)

Aqueles que um dia se desviaram, ou se encontram nesta situação espiritual, devem se arrepender e confessar a Cristo reconhecendo o seu erro. Devem se arrepender de ter trocado a riqueza de Cristo pela pobreza do mundo!

VI. CONCLUSÃO

1.    Tomé perdeu muito por não se ter reunido certa ocasião com os seus irmãos.

2.    Ficou com a fama de “incrédulo”.

3.    A experiência de Tomé demonstrou que, quando a igreja se reúne, o Senhor manifesta-se ao crente duma forma como não se manifesta quando este está isolado.

4.    O Senhor não apareceu a Tomé na casa dele, mas no Cenáculo, aos discípulos reunidos. Jesus se revelou a Tomé dentro da comunidade, aquela era a igreja primitiva, e é na igreja onde Jesus se revela!

5.    O que Tomé perdeu pela sua ausência naquele culto, todos nós perdemos quando não nos reunimos na igreja! Que grande lição! Quando os crentes não têm comunhão com o Senhor não têm desejo de estar com o Seu povo, e quando estão em comunhão com Cristo procuram a comunhão dos seus!

“Uma coisa peço ao SENHOR, e a buscarei: que eu possa morar na Casa do SENHOR todos os dias da minha vida, para contemplar a beleza do SENHOR e meditar no seu templo".  (Salmo 27:4)


Pedro Lage. Palavra do Culto de Hoje!

sábado, 24 de agosto de 2013

PROPOSTA DE LEI QUE QUER TORNAR O ENSINO RELIGIOSO OBRIGATÓRIO EM ESCOLAS PÚBLICAS VOLTA A SER ALVO DE POLÊMICAS


O tema, que gera discussões no campo político e religioso, questiona o desrespeito à laicidade do Estado brasileiro e seu possível fim
Por: Maira Kempf, Simone Fritzen e Daniela Prado
Lançado no ano de 2011, o Projeto de Lei n. 309/2011, de autoria do Deputado e atual Presidente da Comissão dos Direitos Humanos, Marco Feliciano, que visava alterar o art. 33 da Lei n.º 9.394/96, e que, se aprovado, tornaria obrigatório o Ensino Religioso nas escolas públicas de todo o Brasil – facultativo até então – voltou a ser alvo de comentários nas últimas semanas.
Segundo Feliciano, em declaração no site do partido ao qual é filiado (Partido Social Cristão – PSC), conforme a proposta, a escola ofereceria ao aluno que não optasse pelo Ensino Religioso, nos mesmos turnos e horários, disciplinas voltadas para a formação da ética e da cidadania incluídas na programação curricular.
O mesmo, porém, foi retirado de pauta pelo relator da Comissão de Educação e de Cultura (CEC), Deputado Pedro Ucza, do Partido dos Trabalhadores (PT) de Santa Catarina, ainda em maio de 2012. O ato foi considerado inconstitucional, por ferir o § 1°, art. 210 da Constituição Federal, o qual prevê que esse componente curricular constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, ou seja, é de oferta obrigatória por parte da escola, mas de matrícula facultativa para os estudantes.
No entanto, por perceber a importância do Ensino Religioso não como o ensino de uma religião, mas sim dos elementos básicos que compõem o fenômeno religioso, a partir das experiências religiosas percebidas no contexto dos educandos, um substitutivo foi feito e aprovado pela CEC.
Conforme o substitutivo, o Ensino Religioso seria disciplina de oferta obrigatória nos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, mas de matrícula facultativa ao aluno, e parte integrante da formação básica do cidadão, que assegurasse o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, sendo vedadas quaisquer formas de proselitismo.
Além disso, a disciplina deverá pautar-se na valorização e reconhecimento da diversidade cultural religiosa, por meio do estudo dos elementos básicos que compõem o fenômeno religioso, estruturando-se na articulação entre conhecimentos científicos e culturais, fomentando a liberdade religiosa, o direito à diferença e a promoção dos direitos humanos.
Ao aluno que não optar pelo Ensino Religioso, serão oferecidos, nos mesmos turnos e horários, conteúdos voltados para a formação da ética e da cidadania, incluídas na programação curricular da escola. Os sistemas de ensino admitiriam também profissional habilitado em nível superior, em curso de licenciatura de graduação plena em Ensino Religioso, para atuar na docência da matéria nas escolas públicas de Ensino Fundamental.
O Deputado Marco Feliciano, do Partido Social Cristão (PSC), de São Paulo, vem sendo alvo de denúncias e críticas nas últimas semanas, depois de ter dado declarações consideradas machistas, homofóbicas e anti-catolicistas. A repercussão tomou grandes proporções na mídia e, sobretudo, na internet, gerando inclusive campanhas e movimentos sociais para sua deposição, como “Feliciano não me representa”, por exemplo.
Por causa de sua permanência no cargo, o projeto em questão, que já existe desde 2011, ganhou agora visibilidade. Além disso, Marco Feliciano protocolou novamente, nas últimas semanas, sua intenção de que a proposta seja aprovada através de uma nova Proposição de Projeto de Lei, que ainda não tem data para ser votada.
A questão, porém, tem trazido à tona uma antiga polêmica, uma vez que nem todos os alunos são seguidores da mesma religião e o ensino da disciplina é, na maioria dos casos, tendenciosa para apenas uma delas. Além disso, por ser o Estado uma Instituição laica, conforme o artigo 5º da Constituição Brasileira (1988), muitos julgam que o mesmo não deveria estar imponto tal obrigatoriedade.
Para o Pároco Gerônimo Girardi, da cidade de Palmitinho, tornar esse costume uma regra seria de suma importância. Ele defende a premissa ao apontar que o Ensino Religioso não tem um cunho confessional nas escolas, ou seja, não defende uma religião em si, mas sim a ciência da religião.
- O que devemos ter em mente é que, em escolas confessionais, a disciplina tem outro plano de ensino. Nessas, sim, há uma priorização do ensino de apenas uma religião. O projeto pode ser relevante se pensado sobre os dados obtidos no último Censo, onde houve um aumento significativo de pessoas que dizem não acreditar em Deus. Assim, o projeto pode alimentar nos jovens o desejo espiritual e transformar esses índices -, explica.
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Santo da religião católica em oratório em frente à biblioteca da Escola Estadual de Educação Básica José Zanatta, em Taquaruçu do Sul
Foto: Maira Kempf
O Ensino Religioso ainda não exige formação superior na área. Em algumas escolas, as coordenadorias oferecem cursos preparativos. Nestes, são feitos estudos em relação aos valores cristãos, corroborando a ideia da parcialidade de ensino já abordada. De acordo com a Diretora do Instituto Estadual de Educação 22 de Maio, localizado na cidade de Palmitinho, Andréa Carla Senger Piaia, a disciplina é importante, mas torná-la obrigatória é algo complicado. “Deve-se tomar um certo cuidado na forma como ela é orientada dentro das escolas, para que não haja inclinação para nenhuma religião”, explica. Segundo ela, no Brasil, há esse descuido devido à predominância da religião católica. “Os profissionais acabam por tratar apenas temas católicos em sala de aula”, comenta. Andréa defende a opinião da não obrigatoriedade, justificada pela falta de profissionais capacitados para lecionar o ensino de forma imparcial.
Já para o Pastor da Igreja Metodista, do município de Palmitinho, Sr. Alex Sandro Fernandes Nunes o projeto é importante e deve sim se tornar lei. “O Ensino Religioso nas escolas ajuda na formação do caráter dos jovens, aprimorando os valores para uma vida em sociedade”, ressalta. Ele defende ainda que a matéria ministrada na disciplina deve atender a todas as denominações, não seguir apenas uma doutrina.
Constituições Brasileiras e o Estado Laico
Cabe analisar as questões referentes a ligação do Brasil com a Igreja Católica, que tem mais espaço, desde instituída como religião oficial do Império, na primeira Constituição Brasileira, que é datada de 1824. Neste período, o país assumia o catolicismo como a religião oficial. “Outras religiões eram permitidas, mas seus cultos deveriam ser domésticos ou particulares, não podendo ter manifestações externas de templo”, como relata o autor Pedro Lenza em seu livro Direito Constitucional Esquematizado, na 16ª edição de 2012. Esse quadro histórico começa a sofrer modificações com a chegada dos imigrantes europeus, que trouxeram consigo outros costumes e crenças – como o luteranismo. Com essa nova realidade, foi necessário dar espaço às diferenças, na qual está prevista acima, a possibilidade de cultuar, porém com algumas restrições, como o tamanho do templo.
O decreto Nº 119-A, de 07.01. 1890, no artigo 1º, traz em seu corpo: “…passa a ser “prohibido á autoridade federal, assim como á dos Estados federados, expedir leis, regulamentos, ou actos administrativos, estabelecendo alguma religião, ou vedando-a, e crear differenças entre os habitantes do paiz, ou nos serviços sustentados á custa do orçamento, por motivo de crenças, ou opiniões philosophicas ou religiosas”, sendo essa a primeira decretação de laicização do Brasil.
Estava inaugurado o Estado Laico, que viria a ser consagrado pela Constituição da Republica Federativa do Brasil em 1891, passando de império à república. O artigo 72, §7° da mesma traz: “Nenhum culto ou igreja gozará de subvenção oficial, nem terá relações de dependência ou aliança com o Governo da União ou dos Estados.” Foi também nesse período, e com essa nova ordem constitucional que o Ensino Religioso foi proibido nas escolas públicas, além de se tirar do preâmbulo a expressão “Sob a proteção de Deus”. O termo laico quer dizer que o Estado é neutro, leigo em relação às religiões.
Com a Revolução de 1930 e a instituição do Governo Provisório, levando Getúlio Vargas ao poder, foi promulgada a constituição de 1934, na qual ainda se mantinha a separação entre Estado e Igreja. Essa Carta Maior trazia em seu bojo alguns direitos humanos e, com isso, a perspectiva de um “Estado Social de Direito”, como destaca o autor Pedro Lenza. Com Vargas eleito e empossado para governar de 1934 até 1938, instalou-se um antagonismo entre a direita fascista de um lado, defendendo um Estado autoritário, e a esquerda de outro, dando relevância a ideais socialistas, comunistas e sindicais (com representação da Aliança Nacional Libertadora).
Com o fechamento da ANL em 1935 por ato do governo federal, dá-se força para a Intentona Comunista, e, em seguida, uma decretação de estado de sítio, por parte do executivo federal. Pregando a ordem social e a repressão ao comunismo, Vargas outorga a Constituição de 1937, instalando o Estado Novo, que só teria fim em 1945 com redemocratização. Essa Constituição também permanece desligada da Igreja.
Ainda permanece laico o Estado na Constituição de 1946, que consagra direitos sociais e traz liberdade e repúdio ao estado totalitário, busca inspiração nos ideais da Carta de 1891 e de 1934, procurando harmonizar a livre-iniciativa com a justiça social. Nessa linha histórica, a Constituição de 1967, inaugurada sob o regime militar, também se mantém laica, porém com a menção de “Deus” no preâmbulo.
A Constituição Federal de 1988 – que é válida até hoje – traz novos ideais ao nosso país, buscando abarcar direitos fundamentais, necessários a um convívio humano equilibrado, baseado na justiça e igualdade. É com base especialmente na igualdade consagrada no art. 5º da Carta Maior, que dar espaço as várias crenças é indissociável, dessa forma, no artigo 19 da mesma, está escrito: “É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I- estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público.”
Sendo uma república laica, onde devem ser respeitadas todas as manifestações de crença, vê-se ainda o predomínio da igreja católica. Apesar de sua laicização, percebemos no preâmbulo uma citação de Deus “nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil”.
Contudo, não tendo força normativa, o preâmbulo, que apenas traz as linhas básicas do que será abordado pelo nosso ordenamento jurídico, instaura-se uma discussão perante essa abordagem. É o que destaca o autor Pinto Ferreira, em Comentários a Constituição Brasileira (1989): “o preâmbulo é uma parte introdutória que reflete ordinariamente o posicionamento ideológico e doutrinário do poder constituinte”.
Presença de símbolos em prédios públicos 
Crucifixo na biblioteca da Escola fere o princípio da laicidade do Estado
Foto: Maira Kempf
Outro ponto a se destacar no que concerne ao nosso país ser consagrado Estado laico, é a presença de símbolos religiosos em dependências públicas. Esses acontecimentos acabaram por trazer uma discussão acalorada, sob a ótica de que sendo o Estado Laico, não há necessidade de ostentar símbolos religiosos, visto que pode ferir a igualdade dos cidadãos.
Em 2007, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) também julgou representações questionando a presença de crucifixos em tribunais. Entendeu que a permanência dos crucifixos – símbolos religiosos em órgãos do Poder Judiciário – não fere a autonomia do Estado em relação à religião.
O Ministério Público de São Paulo, no ano de 2009, entrou com uma ação civil buscando a retirada dos símbolos religiosos dos prédios de entidades do Governo Federal no estado de São Paulo, baseado no argumento de que o Estado é laico. Em decisão liminar, a Juíza Maria Lúcia Lencastre Ursaia, da 3ª Vara Cível Federal de São Paulo, indeferiu o pedido apresentado, sob o argumento de que o Estado é laico mas não é uma instituição anti-religiosa ou anti-clerical, ainda enfatizando que os símbolos fazem parte da cultura brasileira.
No estado do Rio Grande do Sul, em 2011, foi feito um pedido ao Tribunal de Justiça (TJ) do mesmo, pela Liga Brasileira de Lésbicas e outras entidades sociais de retirada de crucifixos e símbolos religiosos nos espaços públicos dos prédios da Justiça gaúcha. O TJ-RS acatou o pedido em 2012, em decisão unânime. “Resguardar o espaço público do Judiciário para o uso somente de símbolos oficiais do Estado é o único caminho que responde aos princípios constitucionais republicanos de um estado laico, devendo ser vedada a manutenção dos crucifixos e outros símbolos religiosos em ambientes públicos dos prédios”, afirmou o desembargador Cláudio Baldino Maciel em seu relatório.
Para o estudante de Agronomia da UFSM Itamar Natali, 21 anos, que segue os ensinamentos cristãos confessionais, a retirada dos símbolos é algo desnecessário, visto que cada um tem sua religião e todos devem respeitar as crenças do próximo. “Quem não é daquela determinada religião, a qual pertence os símbolos, deve ignorar, já que para si, aquilo não terá nenhuma significação”. diz.
A respeito da repetitividade em vários órgãos governamentais de símbolos que direcionam para a igreja Católica ele acredita que é porque a maior parte da população é católica, logo a religião e seus símbolos são predominantes. Itamar também faz menção a outros órgãos públicos que contam com símbolos religiosos em suas dependências. “Essa proposta se torna curiosa já que estes símbolos religiosos não são encontrados somente em departamentos governamentais, mas em escolas públicas, quartéis e outros locais públicos. Mas as reivindicações se fazem apenas para espaços governamentais. E nos outros departamentos, que são denominados públicos e, da mesma maneira, suportam a circulação de pessoas de todos os credos?”, questiona.
Quadro de santo católico na biblioteca da Escola mostra a predominância da religião na região
Foto: Maira Kempf
Seguidores de outras religiões, que não as predominantes no poder público, porém, pensam de maneira diferente. A estudante do curso de Jornalismo da UFSM Cristiane Maiara Luza, da Umbanda, acredita que independentemente da religião que seguem as pessoas que trabalham nesses espaços, é preciso levar em consideração os demais credos, assim como as pessoas que não possuem uma religião. “Tentar impor os credos dominantes em espaços de uso público é um desrespeito para com a sociedade”, enfatiza.
Também foi aprovada, na manhã da quarta-feira, 27 de março, pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), a Proposta de Emenda à Constituição 99/11, do deputado João Campos, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) de Goiás, que prevê o fim Estado Laico no Brasil. O texto segue para ser votado em plenário e, se aprovado, segue para votação no Senado Federal. A dificuldade na real aprovação da lei é encontra, contudo, por ser a cláusula uma cláusula pétrea, isto é, disposição em que não pode haver alteração, nem mesmo por meio de emenda, tendente a abolir as normas constitucionais relativas às matérias por elas definidas.